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Wintinho e T.O.C.

 Mais uma parte da série "desabafos de uma pessoa que convive com T.O.C.".


Em 15 de Julho de 2005, no auge dos meus onze - quase 12 - anos, minha mãe, meu irmão e eu fomos a um pet Shop procurar por aquele que viria a ser o quinto integrante da família, o irmão de quatro patinhas mais lindo da história. Juntei minha mesada por vários meses, até conseguir o dinheiro necessário para comprar um cachorrinho pequenininho - pequeno porque moramos em um apartamento. Depois de muito procurar, encontramos um "pudinho" branco esperando por nós, bem pertinho de casa - no quase início da rua quarenta e oito. Segundo a vendedora, aquele serzinho que esperava um lar era um minitoy – o que isso significa? Bem, é um animalzinho menor que o poddle tradicional – e completava dois meses de vida naquela data. Segundo meu irmão, essa história de ter dois meses é conversa para tartaruga dormir – uso tartaruga ao invés de boi, porque sou apaixonada por tartarugas. Convencidos mais por Wintinho do que pela moça que nos atendia – afinal, a primeira coisa que ele fez foi tentar nos conquistar em cima daquela mesa azul –, nós o trouxemos para casa. A felicidade não cabia no peito. Finalmente nossa família estava completa. Aquele lurgazinho reservado para um “doguinho” tinha sido preenchido. Preenchido pelo puddlezinho mais lindo da história.

A primeira imagem que tenho de Wintinho em seu novo lar - nosso lar - é do dia em que chegou para completar nossa vida - 15 de Julho de 2005. Ele vinha correndo pelo corredor – bem, não sei de que outra maneira poderia escrever isso sem parecer estranho – em direção a sala. Suas orelhinhas acompanhavam o movimento, deixando claro que aquele dia devia ser celebrado de toda forma – se tem gente que corre quando está feliz, por que o integrante de “quatro patinhas” não pode fazer o mesmo? Ele parecia tão alegre por ter encontrado um lar, por ter uma família para chamar de “sua”. É uma pena que não tenhamos tirado uma foto desse dia tão especial. Me arrependo até hoje. Queria ter registrado não apenas esse momento em particular, mas algumas das lembranças mais doces que tivemos nos primeiros anos de Wintinho aqui em casa. Nos primeiros meses, nosso pequeno era tão miúdo que dormir debaixo da poltrona da sala era cena garantida. Tão bonitinho - sim, estou saudosa! Os anos passaram depressa demais pro meu gosto. De repente estávamos no final de 2009 e início de 2010, época em que a minha vida virou de cabeça para baixo por conta do Transtorno Obsessivo Compulsivo (T.O.C.). Deixei de fazer muitas coisas, como já relatei no conto em que a Menina ajuda o Sábio a entender como lidar com o problema da Neta – eu não deixo claro o que a Neta tem no conto, mas a primeira coisa que me vem a cabeça é síndrome do pânico. Para compensar essas perdas, “ganhei” várias manias – algumas, para ilustrar a dor que é conviver com o T.O.C., me perseguem até hoje – vide lavar as mãos compulsivamente e não andar descalça. Apesar de descrever todos essas desventuras em série, eu deixei de fora a maior perda de todas: brincar com Wintinho, fazer carinho no meu companheiro de madrugadas. Deixe-me explicar! Como não passo pela frente de bancas de revista, televisão, computadores e livrarias, tocar no irmãozinho de quatro patinhas não era opção. O lugarzinho onde ele faz xixi é coberto por jornal. Todo tipo de notícia ruim aparece nessas páginas, principalmente na capa. A única coisa que conseguia pensar era: “não posso me expor a esse perigo. Não quero me tornar uma pessoa ruim”. Como eu já disse no post anterior: releve a lógica por trás dessas ideias aparentemente (?) absurdas. Para explicar como funciona meu T.O.C., eu precisaria contar em detalhes a história por trás dos meus pensamentos automáticos - coisa que prefiro não fazer mais uma vez.

Voltando a Bobinter... A partir de 2010, eu deixei de tentar faze-lo dormir comigo, de envolvê-lo com um lençol quadrado – lençol esse que me leva de volta a infância –, assim como parei de fazê-lo dançar – com cuidado, obviamente. Não sei se ele percebeu meu distanciamento. Talvez não, porque o humano favorito de WinWin é minha mãe. Essa resistência de tocar nele durou dez anos. Na verdade, só em datas especiais colocava Wintinho no colo e, quando isso acontecia, a ansiedade era sufocante. Como eu falei, uma das minhas manias é lavar as mãos compulsivamente depois de entrar em contato com alguma coisa poluída. Quando fazia carinho em Wintinho, o resultado era o mesmo: lá estava eu lavando as mãos, os braços, as pernas – tudo o que tivesse em contato com ele. Em 2020, infelizmente, a mania continuava firme e forte, mas, desde março, consigo passar um pouco mais de tempo antes de me “despoluir”. Isso se deve, principalmente, aos sustos que Wintinho nos fez passar no início do ano passado. Como contei em um texto recente, ele está velhinho – 15 anos não é pouca coisa – e a saúde já não é mais a mesma – um segundo, preciso respirar fundo. É uma pena perceber que foi a iminência de perdê-lo que me fez lutar mais bravamente contra o T.O.C. Por que eu não reagi antes? Será que me acomodei demais no universo das manias? Será que ele – meu irmão quadrúpede – aceitaria um pedido de desculpas dessa humana que o ama tanto? Perdão, Wintinho, não era/é para ter sido/ser assim. Eu fiz e faço meu melhor. Só não sei se foi/é/será suficiente!

Comentários

Tamy disse…
Own, Carol. Que lindo texto e super bem escrito como sempre. Adoro seus textos principalmente por você explicar como o seu TOC funciona e dessa forma posso te entender um pouquinho melhor. Pode ter certeza que Wintinho sabe o quanto você o ama e entende os seus momentos. Parabéns!👏🏻😘
Chaconerrilla disse…
Obgd, Tamy!!!! Tem sido muito terapêutico escrever sobre meu T.O.C. Tentarei pensar em outros posts. Volte sempreeee!
Danielle disse…
Adorei. Tudo é o que passou e passa. Muito bem escrito.
Chaconerrilla disse…
Obrigadaaa! Fico muito feliz que você gostou. Tentarei ser mais frequente aqui!
Sarah disse…
Amiga! tenho certeza que ele lhe ama imensamente!!

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