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Da Série: De onde você veio, Menina? E o seu amigo, o Sábio?

O conto de hoje é dedicado a theridiculousone como forma de agradecê-lo pelos ouvidos e pelo tempo. Qualquer comentário, luz, estrela ou chuva é bem-vindo aqui ou no twitter @Chaconerrilla

A Menina & O Sábio – Pedacinhos do Céu

O primeiro trovão ecoou pelo céu. O sábio estendeu o guarda-chuva para fora de casa e o abriu antes que a chuva engrossasse. No instante em que pôs os pés no gramado verde do jardim de casa, o primeiro pinguinho caiu no guarda-chuva. Outros se juntaram ao primeiro, tornando o dia ensolarado em uma manhã chuvosa. Um pouco a frente, a Menina apareceu sorrindo.
- Parece que o céu preferiu deixar o azul descansar. – Falou a Menina, olhando para o Céu. – Bom, não é? – Ela sorria.
- Você gosta da chuva, Doce Menina?
- Você não?
- Acho que prefiro o sol. – Comentou o Sábio, pensando no que a Menina falaria a seguir.
- Que pena! – Disse a Menina tristemente. – Por que você não experimenta sair sem o guarda-chuva? Tenho certeza que o Sábio saberá do que estou falando...
- Não tenho mais idade para isso, Doce Menina. Se sair sem o guarda-chuva, é bem provável que ela me deixe doente.
- Bem, nunca saberemos, então. Mas, tudo bem, posso contar os segredos da chuva enquanto caminhamos a padaria...
- Como você... – Começou o Sábio, antes de se interromper e lembrar que ela o conhecia como ninguém mais.
- Podemos ir? – Perguntou a Menina. O Sábio assentiu. Eles caminharam em silêncio por algum tempo, até a Menina decidir dar voz as palavras – Posso dizer o seguinte, ninguém sabe o segredo da chuva até olhar pra cima e observá-la caindo. O Sábio já parou para observá-la? – Ele meneou a cabeça. – Quando ela deixa o céu, pode até pensar que sua trajetória será fácil, sem grandes dificuldades, mas é só a primeira gota conhecer o ar que ela descobre que o vento sopra em várias direções, levando-a para um lado desconhecido, diferente de onde seu pouso estava previsto. Deve ser assustador. - Comentou a Menina balançando a cabeça para espantar o pesamento. - Acho que o mesmo acontece com a vida... – O Sábio sorriu, entendendo o que a Menina queria dizer. – Ela começa em um lugar e, por destinou ou por acaso ou por uma mistura dos dois, termina em um lugar inesperado. Quantas vezes o Sábio não foi capaz de prever que a vida chegaria ao ponto que chegou? Quantas vezes a vida se escreveu de uma maneira diferente daquela que era planejada? A vida é uma incerteza infinita, em que as probabilidades são tão inconstantes quanto possíveis, enquanto o amanhã existir...
- E o que seriam o vento, as folhas e todos os guias das chuvas? – Ele sabia a resposta, mas gostava de escutar a Menina falar.
- São os amigos, a família, os conhecidos, os desconhecidos, a energia, tudo. Com os conselhos, os exemplos, eles nos ajudam a encontrar o caminho, não acha?
- Não só encontrar, mas a perder...
- E a reencontrar. – O Sábio e a Menina sorriram. - Mas a chuva não é só tudo isso. Tem mais, ela nos dá uma sensação de liberdade, de aventura... É animador desafiá-la, porque se decidimos dançar debaixo da chuva seguindo a melodia que ela emite, estamos um passo mais perto de pegar uma gripe, um resfriado... Mas também podemos ter a sorte de só nos divertirmos, sem consequências...
- Não se esqueça dos pais. Eles podem ficar preocupados. Ninguém quer ver o filho doente. – A Menina riu.
- Tem razão. É diversão quase sem consequência. – Agora o Sábio também ria - O que eu quero dizer é que a chuva também representa o não ter medo de se arriscar, ter coragem de seguir o coração, de tentar. E se não der certo, você pode lembrar-se do último segredo da chuva. – A Menina fez suspense antes de continuar - Se a água leva a poeira, o sono, por que a chuva não pode levar o que pesa na alma? O que a deixa triste? - Perguntou a Menina ao Sábio, deixando-o surpreso. – Afinal, os pinguinhos de chuva são pedacinhos do Céu e um banho deles é como um abraço bom de alguém que já se foi ou do Alguém que olha por nós todos os dias. - O Sábio permaneceu em silêncio, mas a Menina sabia pelos seus olhos que deixara o amigo feliz e pensativo. Agora, o Sábio sabia que a tempestade não era mais sinônimo de dias ruins, mas sim de metáforas da vida em si.   


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