Estão preparados para essa nova história? Venham descobrir as famílias da Menina e do Sábio!
P.S.: Ainda não não corrigi os erros. Estava ansiosa demais para postar esse conto! S2
P.S.: Ainda não não corrigi os erros. Estava ansiosa demais para postar esse conto! S2
Mês de Setembro
era sempre mês de festa. Em 2010, então, era ainda mais especial. O Pai da
Menina completava 50 anos. Como dia 23 caía em uma Quinta-feira, o jantar de
comemoração de meio século do Patriarca da família Oliveira seria no dia
seguinte, sexta-feira, dia 24, aniversário de 100 anos de Serrapilheira, a cidade onde as famílias da Menina e do Menino moravam. O lugar
escolhido para tal celebração não poderia ser outro senão o “Mostarda &
Mel”, restaurante da mãe da Menina. Como a reforma do primeiro andar – onde
ficava o salão de festas – atrasou e como era feriado na cidade, a pintura –
com tinta a base de água e, por isso, sem cheiro, para não sufocar os convidados
– teria que ficar por conta dos familiares e dos amigos de Lívia e Francisco.
Por isso, quando o relógio anunciou que eram sete horas da manhã, Luís, o
pai da Menina, decidiu que era hora de começar os trabalhos daquele dia mais do
que especial. Ele e Helena – mãe da Menina – estavam de pé desde cedo, como já
era de costume. Por outro lado, Miguel – o irmão mais velho da Menina –, Júlia (ou Miudinha, como era mais conhecida) – a caçulinha da família –, e Lívia e
Francisco ainda dormiam, querendo aproveitar os minutinhos a mais que um
feriado proporcionava.
Helena deu banho em Júlia e colocou um maiô branco com girassóis
estampados em toda a malha, para que a filha mais nova pudesse “ajudar” na
pintura sem se preocupar com a tinta na roupa. Depois, com ajuda da Pequena de
dois anos e oito meses, o Pai da Menina acordou Miguel. Não existia maneira
mais fácil e eficaz de acordar o Primogênito da família. Júlia fazia milagres
quando o assunto era Miguel. Assim como a Caçula, ele preferiu vestir uma roupa
de banho, um short preto de tactel e calçar uma sandália havaiana desgastada. A
camisa branca jogada por cima do ombro só seria usada caso precisasse sair de
carro para comprar algum material de pintura.
Por último, Luís foi chamar Lívia e Francisco, que, mesmo com toda a
movimentação na casa, ainda dormiam no quarto dela.
- O que você me
diz, Miudinha? É seguro entrar no quarto da sua irmã? – Perguntou a filha mais
nova. Ainda no braço do pai, ela assentiu. – Vou confiar em você, então! –
Tentando fazer o mínimo de barulho possível para não assustar a filha e o
genro, Luís abriu devagarzinho a porta do quarto. Lívia dormia de lado, fazendo
o braço de Francisco de travesseiro. Seu braço esquerdo descansava no peito do
namorado, que, inconscientemente, segurava aquele abraço improvisado com a mão
livre. O cobertor florido e a camisa cinza de Francisco estavam no chão, sinais
de que nem o ar-condicionado conseguia amenizar o tempo quente, característico
daquela época do ano. Ao observar os dois, o Pai da Menina viajou no tempo,
lembrando-se da época em que ele e Helena namoravam. Na época, dormir na casa
um do outro era algo impensável: “Só
depois que os dois completarem 21 anos” diria o Avô Materno da Menina.
- Chico!!!!! –
Gritou a Miudinha, interrompendo o filme que se passava na cabeça do Pai. Lívia
e Francisco mal se mexeram. Por isso, Luís decidiu adotar a tática número dois:
deixar a caçula subir na cama da irmã. O Menino foi o primeiro a acordar. Ainda
deitado, ele se desvencilhou cuidadosamente de Lívia para não assustá-la e se
espreguiçou milimetricamente, depois sentou e esfregou os olhos, na tentativa
de espantar o sono.
- Bom-dia,
Miudinha! – A Caçula sorriu de olheira a olheira. Lívia ainda dormia. – Você me
ajuda a acordar essa dorminhoca aqui? – Perguntou Francisco a Irmã Mais Nova de
Lívia. Júlia, então, deitou em cima da irmã e a encheu de beijos. A Menina
apertou os olhos e, aos pouquinhos, foi despertando. Lívia retribuiu os beijos
molhados da Pequena e, depois de aperta-la o suficiente, ganhou um beijo do
Namorado.
- Eca! –
Reclamou Júlia. A Menina riu.
- Bom dia,
Miúda! – Falou Lívia, ainda meio grogue. Com a ajuda da Irmã, ela sentou-se na
cama e observou o dia pela janela do quarto. O céu estava todo azul e o sol mostrava-se
pronto para começar mais um dia. Por outro lado, as nuvens pareciam passear por
outros lugares. De onde estava, Lívia não enxergava nenhuma nuvem de passagem
com destino incerto. Ao que parecia, o dia seria iluminado, não apenas por
conta do sol, mas também pelos olhares alegres de quem celebra mais um ano de
vida de alguém especial. Ao perceber que a Namorada estava longe, em uma dessas
viagens que se faz dentro de si, Francisco sorriu e olhou para a Pequena. A
Miúda observava atentamente a blusa que a Menina usava – um presente que os
Pais de Francisco trouxeram da Disney. A
blusa era branca e Mushu e o Grilo da Sorte de Mulan, o filme da Disney
preferido de Lívia, cobriam boa parte da frente. – Surpreso por vê-la vestindo
o presente dos Pais, o Menino beijou a Menina mais uma vez. Pega de surpresa,
Lívia sorriu orelha a orelha, feliz por estarem ali, lado a lado. – Bom dia, Amor! – Desejou Lívia, voltando,
finalmente, de sua viagem interna.
- Bom dia,
Linda! – Desejou Francisco de maneira carinhosa.
- E eu? Não
mereço “bom dia”?
- Bom dia, Luís!
– Desejou Francisco.
- Bom dia, pai! - Desejou Lívia. – Que horas são?
- Sete e
quarenta. – Respondeu o Pai da Menina, entrando no quarto e pegando a Miúda no
colo. – Vamos! Levantem-se e vão tomar banho. Precisamos começar a pintar o
restaurante. – Antes de sair, entretanto, Luís pediu que Lívia e Francisco
usassem roupa de banho para não sujar a roupa de tinta. – Chico, se precisar,
Miguel deixou um short em cima da cama.
- Mia já chegou?
Ela disse que viria ajudar. – Perguntou Lívia um pouco mais acordada sobre a
irmã mais nova de Francisco.
- Chegou. Ela e
Miguel estão lá embaixo tomando café da manhã. – Explicou Luís. – Ah, antes que
eu me esqueça, Joaquim disse que virá mais tarde. – Continuou o Pai da Menina,
repassando a informação que ouvira de Miguel sobre o irmão mais velho de
Francisco. – Aparentemente, ele e Luciana brigaram mais uma vez. – O que não
era novidade. Como todo mundo sabia, os dois viviam entre tapas e beijos há
quase dois anos. Pedro e Laura – Pais do Menino –, inclusive, não entendiam
como o relacionamento sobrevivia a tanta discussão.
- Então,
Chira-Choi também vai chegar mais tarde... – Concluiu Francisco, referindo-se
a cunhada Luciana que, por sinal, era melhor amiga de Lívia.
- Por isso,
apressem-se! Vocês têm dez minutos para descer e não se fala mais isso.
- Você já
decidiu a cor da tinta? – Perguntou Lívia, mas, antes que terminasse de falar,
o Pai já tinha fechado a porta.
- Helena vai
enlouquecer desse jeito. – Comentou Francisco, fazendo Lívia rir. Nunca vira o
Pai tão animado com uma festa de aniversário. Segundo ele, 50 anos é um marco
na vida de qualquer um. “Meio século não
é pouca coisa” repetia todo dia, desde que começara a organizar o jantar de
aniversário, duas semanas atrás.
Um pouco mais de dez minutos depois,
a Menina e o Menino desceram. Lívia vestia a parte de cima de um biquíni
laranja escuro com detalhes em verde e um short de tactel cinza, enquanto Francisco
usava a bermuda azul escura, também de tactel, que Miguel deixara em cima da
cama antes de descer.
- Finalmente! –
Exclamou o Pai da Menina. – Um segundo a mais e vocês conheceriam a fúria de
Luís Oliveira. A família de Lívia, e Francisco e Mia sorriram. – Prontos para o
dia mais importante do ano? – Como ninguém respondeu, Luís perguntou mais uma
vez. – Prontos para o dia mais importante do ano?
- Sim. –
Responderam os presentes em uníssono.
- Melhor assim!
– Comentou o Patriarca, transpirando alegria pelos poros. – Lívia, Francisco,
Miguel, Mia e Júlia ficarão responsáveis pela pintura do salão de festas. Papai
e eu escolheremos a louça para o jantar...
- Você ainda não
escolheu? – Perguntou Miguel. – Ou desistiu dos pratos e copos que tinha
escolhido?
- Desistiu. –
Respondeu a Mãe da Menina. – Três vezes. – Para dar ênfase as palavras, Helena
levantou a mão esquerda, indicando o número TRÊS com os dedos.
- De hoje não
passa...
- Não me diga! –
Brincou Lívia.
- Vocês estão
perdendo o foco... Onde estávamos?
- Na louça... –
Respondeu Lívia.
- Engraçadinha! –
Em resposta, a Menina estirou a língua para o pai, fazendo-o sorrir. – Helena e
mamãe ficarão responsáveis pela decoração...
- E as mesas e as
cadeiras? Você disse que usaria as que estão no depósito... – Comentou Miguel.
- Eu e seu Avô
ficaremos responsáveis por isso, depois que escolhermos a louça...
- E lavá-las...
– Lembrou Helena.
- E lavá-las. –
Repetiu Luís. – As tintas já estão no salão de festas. Já forrei o piso com
papel madeira e deixei os rolos de pintura em cima da mesa. A escada está no
depósito. Se precisarem, sabem onde encontra-la. Miguel, você comprou o
material para Miudinha “ajudar” na pintura?
- Está lá em
cima, no meu quarto. Vou pegar! – Para a Miudinha não ficar de fora do grupo
dos “jovens”, o irmão da Menina comprou um conjunto de tinta guache, três
pinceis de tamanhos diferentes e quatro cartolinas brancas. Desde que entrara
na escola, no início desse ano, a pequena não desgrudava de uma folha de papel
e de seus conjuntos de hidrocor e de lápis de cor quando estava em casa. Luís
dizia que aquilo era um sinal de que a família seria reconhecida pelos quadros
da filha mais nova, já que o Filho Mais Velho não tinha a intenção de tornar
conhecidos os seus desenhos. Helena, por outro lado, achava que o amor pelo
desenho e pela pintura era passageiro.
- Certo... Falta
mais alguma coisa? – Perguntou Luís apreensivo. – O Chef já chegou?
- Sim, Luís!
Estão todos prontos. – Garantiu a Mãe da Menina. – Podemos ir? – Sem mais nada
a acrescentar, o grupo se dirigiu ao restaurante. Havia um portão no quintal de
trás da casa da Menina que dava acesso ao Mostarda & Mel. Na época em que o
restaurante foi construído, Luís e Helena acharam que seria conveniente
trabalhar perto de casa, principalmente, porque eles não sabiam como seria a
rotina com a chegada dos filhos. Noventa por cento do tempo, os dois
concordavam que serem vizinhos do trabalho era realmente muito melhor. Os
outros dez por cento apareciam em algumas ocasiões, quando o restaurante estava
cheio, por exemplo.
Às 08h15min, a família da Menina começou os trabalhos. No andar de cima,
no salão de festas, a turma formada por Lívia, Miguel, Francisco e Mia decidiu
formar duplas, enquanto a Miudinha ficaria responsável pelas cartolinas. O
salão tinha duas entradas principais, separadas por uma parece em meia-lua,
onde geralmente ficava a mesa do bufê. Para alivio do quarteto, a Mãe da Menina
deixara um bilhete que dizia:
“Não peçam a opinião do aniversariante! Conversei com a
Arquiteta responsável pela reforma do restaurante para decidir as cores. Usem o
rosa antigo e o branco. Por favor, tomem cuidado com a minha Pequena. –
Helena.”
- O que seria de
Luís sem Helena? – Brincou Francisco. Lívia e Mia riram durante bons segundos.
Miguel, por outro lado, sorriu timidamente. O Irmão Mais Velho da Menina era
sempre muito sério e quando sorria, sorria discretamente, como quem pede
desesperadamente para não ser notado. Ele não era de falar muito, nem de
interagir com quem não conhecia bem. Quem o conhecia bem, no entanto, sabia que
o silêncio de Miguel dizia muito mais do que qualquer palavra alcançaria
expressar. Ouvi-lo dizer mais de duas frases por vez era quase sempre uma
surpresa. Certa vez, o avô da Menina – ou Estrelinha, como costumava chama-la
–, Haroldo, perguntou se a Neta já observara como Miguel e Mia conversavam
sempre através do olhar. “Pensei que era
a única. Francisco disse que é coisa da minha cabeça” comentou a Menina,
confessando que, às vezes, se via torcendo pelos dois, apesar do Irmão ter
Namorada. Mas, só o Sábio Tempo saberia dizer se existiria chance para aquele
casal, no momento, improvável.
- Um
aniversariante sem festa. – Respondeu Miguel, interrompendo o devaneio de Lívia
sobre como, até agora, o Irmão e a Cunhada se encontraram várias vezes nessas
ruas por onde o olhar passeava. Hoje, Miguel falava mais que o normal. Lívia olhou para Mia.
- Já começaram?
– Gritou o Pai da Menina do andar debaixo, depois de ouvir a risada da Turma
Jovem.
- Sim! –
Responderam Lívia, Francisco e Mia em uníssono. Uma hora mais tarde, a Menina e
o Menino pintavam a parede em meia-lua de rosa antigo, enquanto o Irmão da
Menina e a Irmã do Menino pincelavam o branco nas paredes laterais. A Miúda
deixara de colorir as cartolinas para desenhar nas costas de Miguel. Entrando
na brincadeira, o Irmão Mais Velho da Menina pegou um dos pinceis que estava no
chão e desenhou um pingo de água azul claro no braço da Pequena.
- É pra regar os
girassóis. – Explicou ele, apontando com a outra ponta do pincel o maiô de Júlia. A Miudinha sorriu de orelha a orelha, feliz com o desenho que o irmão
fizera.
- Lili, Lili, Lili,
olha! Para regar os girassóis. – Repetiu a Pequena, tornando-se o centro das
atenções. Lívia sorriu e olhou para Miguel.
- Agora sim,
eles não vão ficar com sede. – Comentou a Menina. A Miúda assentiu, sorrindo
com os olhinhos cor de amora negra. Para que os girassóis não ficassem sem
água, Lívia e Francisco pediram o pincel a Miguel e desenharam uma gota de água
cada no braço de Júlia. Mia foi a última a contribuir com aquela chuva
improvisada, chuva que não era sinônimo de dias difíceis, chuva que era
compartilhar o momento. Como forma de agradecer pelos pinguinhos, a Miúda
pintou uma florzinha no braço de cada um deles. Inspirado pela Cunhadinha,
Francisco pegou a tinta vermelha e desenhou um coração nas costas de Lívia,
escrevendo F&L dentro dele. Na barriga, ele pincelou um sorriso amarelo
cheio de dentes. A Menina, por sua vez, decidiu pintar o sol, um par de nuvens
e algumas gaivotas no peito do Menino. O coração também foi pintado nas costas.
- Então, Miúda,
quem desenha melhor? – Perguntou Mia sorrindo.
- CHICO! –
Gritou a Pequena, fazendo o quarteto rir.
Perto da hora do almoço, Lívia e Francisco terminavam de pintar as
paredes do salão de festas, enquanto Mia e Miguel lavavam as mesas e as
cadeiras no quintal do restaurante. No térreo, Helena organizava a decoração,
enquanto Luís terminava de lavar a louça escolhida para o jantar. Haroldo – o
avô paterno da Menina – exausto de tirar o pó dos pratos, copos e talheres
escolhidos pelo Filho, decidiu tirar um cochilo. Como a Miudinha também parecia
muito cansada, depois de se revezar entre Mia e Miguel e Francisco e Lívia, Haroldo
levou Júlia para almoçar e tirar a soneca da tarde. Os demais almoçariam mais
tarde.
- LÍVIA! –
Chamou Helena. – Quando vocês terminarem de pintar o salão, não se esqueçam de
levar as caixas que estão aqui embaixo, perto da porta de saída lateral, para o
depósito. – Alguns segundos depois, a Menina e o Menino desceram.
- Onde? –
Perguntou Lívia. Ao olhar para filha e para o genro sujos de tinta, o Pai da
Menina se assustou.
- O que aconteceu
com vocês? – A Mãe da Menina deixou a decoração de lado e virou de costas para
entender a expressão de surpresa do marido.
- Intervalo
criativo. – Brincou Lívia. Os pais riram.
- As caixas
estão em cima da mesa perto da porta. – Indicou a Mãe da Menina. Lívia e
Francisco seguiram a orientação de Helena e encontraram caixas e mais caixas
esperando por eles. Dizer que os dois abriram a boca não seria exagero. –
Depois, podemos parar pra almoçar. Sua avó fez a lasanha que Francisco tanto
gosta... – Continuou a Mãe da Menina sem se importar com a reação dos dois. Ao
ouvir sobre o prato preparado pela Avó, Lívia despertou do choque de ter que
carregar tudo aquilo e riu. Por algum motivo inexplicável, Bendita – a avó
paterna – sempre paparicava mais o Francisco do que os próprios netos. Segundo
ela, o Menino foi, provavelmente, seu neto em outras vidas. A maioria dos
envolvidos acreditava nessa possibilidade.
- Lasanha... –
Repetiu Francisco, de repente, entusiasmado. – Pronta? Precisamos terminar isso
o mais rápido possível. Não podemos deixar Bendita esperando por muito tempo. –
Lívia, Helena e Luís acharam graça. A Menina escolheu a caixa de copos,
enquanto o Menino pegou a caixa de pratos. Ao saírem pela porta lateral e
descerem os três degraus da escada, Lívia e Francisco se depararam com Mia e
Miguel gargalhando. Os dois se divertiam com a água que a chuva proporcionara.
Os desenhos feitos com tinta guache escorrendo até o chão.
Antes que os olhos de Lívia e Francisco fossem capazes de registrar – ou
talvez antes que eles pudessem compreender a cena que se desenrolava diante
deles –, Mia e Miguel estavam a um palmo de distância um do outro. As risadas
se transformaram em um constrangimento mútuo, ou melhor, em um constrangimento
geral para os quatro. De onde a Menina e o Menino estavam, não era possível
enxergar, mas Mia e Miguel não sabiam se olhavam para os olhos ou para a boca
um do outro. Um segundo e Mia tirou de dentro toda a coragem que guardava e
beijou Miguel. Meio surpreso, o Irmão da Menina precisou de meio segundo para
entender o que acontecia... E quando entendeu, ao invés de afastá-la, Miguel
correspondeu para surpresa de Francisco e de Lívia. No caso da Menina, a
surpresa não estava relacionada à existência de sentimentos entre os dois, e sim
ao Irmão não seguir o roteiro milimetricamente planejado de sua vida. Se a
situação era desconfortável para Lívia e Francisco, o cenário era muito pior
para a Namorada de Miguel, que observava a cena alguns metros atrás da Menina e
do Menino. Sem saber o que fazer naquele momento, a Cunhada da Menina foi
embora, as lágrimas caindo descontroladamente.
O beijo demorou muito mais do que o esperado, parando apenas quando Mia
se lembrara da cunhada de Lívia. Arrependida, a Irmã do Menino se afastou
abruptamente, pedindo desculpa ao Irmão da Menina. Por sorte, Mia saiu às
pressas pela lateral esquerda do restaurante, não avistando Lívia e Francisco. Confuso,
Miguel colocou a mão na boca, sorrindo. Mas, o sorriso não durou muito. Quando
o Irmão da Menina olhou para o lado, encontrou Lívia e Francisco parados
observando a situação sem saber o que fazer. Extremamente constrangido, Miguel
pegou a camisa branca que estava pendurada na escada, vestiu e, completamente
perdido, saiu sem dizer nada.
Francisco e Lívia estavam parados e completamente absortos em pensamentos
próprios quando Helena apareceu, chamando pela filha:
- Lív... Ué,
vocês ainda não deixaram essas caixas no depósito? – Nenhum dos dois respondeu.
– Lívia! Francisco! – Chamou a Mãe da Menina, tentando faze-los despertar do
sonho acordado em que estavam. – Aconteceu alguma coisa? Ei! – Helena precisou
ficar frente a frente com os dois para que eles acordassem.
- Ah! –
Assustou-se Francisco.
- Aconteceu
alguma coisa? – Perguntou Helena novamente, preocupada. Antes que Lívia ou
Francisco pudesse responder, o som de alguma coisa quebrando ecoou pela porta.
– Luís...
Depois que as caixas foram todas
transferidas para o depósito, a Menina e o Menino almoçaram em silêncio no
terraço da casa, enquanto tentavam, sem sucesso, proteger a comida de Goiaba, o
poodle da família. Como ainda faltavam alguns detalhes, Lívia e Francisco se
juntaram ao que restara da família para terminar de organizar o jantar de
aniversário que aconteceria a poucas horas de distância. Mia e Miguel tinham
desaparecido, Joaquim e Luciana não enviaram notícias, e Haroldo e Júlia ainda
dormiam no andar de cima da casa da família. Por isso, Luís ligou para Pedro e
Laura, pais de Francisco, em busca de ajuda. Além dos sogros de Lívia, alguns
amigos de uma vida inteira de Helena e outros de Luís apareceram para ajudar. Às
cinco da tarde, tudo estava pronto para o grande dia planejado pelo Pai da
Menina. Ele parecia uma criança de tão feliz, sorrindo de orelha a orelha e
fazendo os demais sorrir.
Antes que a Mãe se lembrasse daquela pergunta não respondida, a Menina
chamou o Menino para tomar banho. A roupa e os acessórios foram escolhidos
ontem à noite, a pedido de Luís, para evitar eventuais atrasos. Lívia usaria um
vestido rosa claro rodado e Francisco vestiria uma calça jeans clara e uma
camisa azul escura. O Menino tentava desfazer o nó que impedia a Menina de
soltar o cabelo enquanto conversavam sobre o ocorrido.
- Acho que nunca
vi Miguel sair da linha... – Comentou Francisco, ainda sem saber o que achara
da cena.
- Acho que vi
meu irmão tão descontraído assim poucas vezes. – Comentou Lívia sorrindo. – AI!
Com cuidado, seu grosso! – Francisco sorriu.
- Pronto. –
Depois de alguns segundos, o Menino finalmente conseguiu desamarrar o cabelo da
Menina. – O pitó.
- Obrigada, Amor
Mío! – Agradeceu Lívia, colocando o prendedor de cabelo no pulso direito. Com a
missão quase impossível cumprida, Francisco ligou o chuveiro e permaneceu debaixo
d’água por alguns instantes. Quando já estava todo molhado, o Menino desligou o
chuveiro e passou shampoo no cabelo, enquanto Lívia esfregava suas costas para
apagar os desenhos. Além dos rabiscos feitos por ela e pela Miúda, algumas
manchas de tinta, utilizada para pintar o restaurante, estavam espalhadas por
todo o corpo. – Você se esfregou nas paredes? Suas costas estão uma verdadeira
obra-prima de arte... – Francisco riu.
- Lívia... –
Começou o Menino em tom sério. – Você acha que minha irmã e seu irmão estão
juntos? – Ao ouvir o questionamento do Menino, a Menina parou o que estava
fazendo para pensar a respeito.
- Acredito que
não.
- Não? – O
Menino deu meia-volta para poder olhar a Menina nos olhos. – Então...
- Acho que eles
se deram conta de como se gostam... – Uma pausa breve para reformular a frase.
– Ou melhor, acho que os dois finalmente admitiram o que sentem um pelo outro “em
voz alta”. – As palavras de Lívia faziam sentido para Francisco, ele precisaria
admitir isso posteriormente, principalmente, por saber, por experiência
própria, que transbordar o que vem de dentro para o outro exige uma coragem, muitas
vezes, não descoberta rapidamente. – Te incomoda? – Perguntou a Menina.
- Não... Sei. –
Admitiu Francisco. Lívia riu. – O que foi?
- Sabe o que
isso me lembra? – O Menino não fazia ideia. – 2008. – Do que Lívia estaria
falando? Francisco queria saber – Quando a gente começou a namorar, Miguel teve
uma reação parecida. Ele não era contra, mas também não era a favor... –
Revelou a Menina. O Menino não conhecia aquela história. – Segundo Vovó, Miguel
não sabia como lidar com a ideia de me deixar crescer. Para ele, eu sempre
seria a irmã mais nova, indefesa e que precisava ser cuidada. – Francisco riu,
lembrando-se da primeira vez que dormira na casa de Lívia, em Novembro de 2009.
– Agora vira de costas. – Pediu Lívia. – Ainda não saiu toda a tinta... E a
essa altura, o shampoo já deixou seu cabelo limpíssimo.
- Sim, senhora.
– Brincou Francisco, sentindo-se mais leve – A Senhora que manda!
Às 21 horas do dia 24 de Setembro,
Lívia e Francisco já estavam no salão de festas, beliscando os aperitivos
servidos pelos garçons. Helena conversava com Pedro e Laura, enquanto Bendita e
Mia – ainda desconsertada – falavam sobre o cardápio da noite. Haroldo, por sua
vez, estava no andar debaixo do restaurante – no jardim –, distraindo Júlia com
a ajuda de Goiaba. Já Luís, o aniversariante do dia, procurava o discurso que
escrevera alguns dias antes para ler depois dos parabéns. Depois de revirar a
casa por mais de 15 minutos, o Pai da Menina desistiu de encontrar o guardanapo
onde tinha registrado suas palavras, decidindo que improvisaria quando a hora
chegasse. Quando saía da sala de televisão – último cômodo que revistara –,
Luís ouviu Miguel chegar a casa, ainda sujo de tinta. Sem dar muitas
explicações, o Irmão Mais Velho da Menina se desculpou e subiu apressadamente
para tomar banho. ‘Não demore!’, pediu Luís. As 21h30min, o aniversariante foi,
finalmente, receber seus convidados.
- CHEGUEI! –
Anunciou Luís, com um sorriso de orelha a orelha. Atrás do Pai da Menina,
vinham a Filha Mais Nova e o Avô, visivelmente cansados depois de vários
minutos brincando com Goiaba. Os dois se juntaram a dupla formada por Bendita e
Mia.
- Finalmente! –
Brincou o Pai do Menino. – Achou o discurso?
- Não! –
Lamentou Luís, aproximando-se de Helena, Pedro e Laura. – Vou precisar
improvisar...
- A arte de
improvisar é para poucos. Não sei se você dará conta... – Comentou o Pai de
Francisco em tom de brincadeira. Os dois se conheciam desde pequenos. Se não
fosse pelo tempo em que Pedro passou fora de Serrapilheira com a família, o Pai
de Francisco e o Pai de Lívia teriam convivido quase 45 anos.
- Você vai se
sair muito bem, querido! – Incentivou Helena, fazendo Luís sorrir de orelha a
orelha. – Tentei falar com Miguel por telefone, mas só cai na caixa postal.
- Ele já está em
casa. Foi tomar banho.
- Ele disse onde
estava? – Perguntou Helena, preocupada.
- ‘Na casa de Clara’. Na verdade, ele só disse ‘Clara’ e subiu correndo... Você sabe como
Miguel não gosta de desperdício, principalmente de desperdiçar palavras.
- Por que você
não chamou Clara para subir ao invés de fazê-la esperar?
- Ele chegou
sozinho. Pela expressão que tinha no rosto, acho que Clara não virá. – Helena
não se surpreendeu. Pedro e Laura também não. Se por um lado Joaquim e Luciana
viviam entre tapas e beijos, Miguel e Clara pareciam continuar juntos por
comodidade.
- Achei que
fosse ganhar a aposta... – Comentou Pedro.
- Que aposta? –
Perguntou Laura, desconfiada. Ao perceber que as palavras foram ditas em voz alta,
Pedro olhou para Luís, sem saber o que fazer para contornar a situação. Luís,
por outro lado, parecia não se importar com a revelação feita pelo amigo,
explicando a aposta para Helena e Laura.
- Eu apostei que
o namoro de Miguel terminará primeiro. Pedro apostou que Joaquim e Luciana não
durarão até lá. – Helena e Laura riram.
- Por que não
pensamos em fazer isso? – Brincou Laura.
- Será que somos
péssimos pais? – Perguntou Pedro.
- Claro que não!
Somos apenas bons observadores. – Afirmou Luís. O quarteto voltou a rir. –
Falando neles, onde estão Joaquim e Luciana? Os pais dela virão?
- O pai. –
Corrigiu Helena. – A mãe faleceu quando Luciana ainda era bebê. Não tinha nem
um ano. – Por alguns segundos, os quatro não disseram uma palavra. O silêncio só
fora interrompido quando Miguel chegou ao salão de festas.
- Olha só quem
finalmente apareceu. – O pai da Menina apontou para o Filho Mais Velho. Miguel
vestia uma calça jeans escura, uma camisa branca e um casaco marrom. Nada muito
diferente do habitual. Entretanto, esse detalhe não é realmente importante para
a estória. O que veio a seguir sim – uma sucessão de constrangimentos. Miguel
procurou primeiro por Mia, sustentando olhar da Irmã de Francisco por tempo
suficiente para chamar a atenção de Haroldo, Helena, Laura e Luís. Ao observar
os dois, o Avô da Menina estreitou os olhos e inclinou a cabeça, como quem sabe
o que dizem as entrelinhas. Depois, Miguel, mais vermelho do que o normal, enxergou
Lívia e Francisco e, por fim, encontrou o olhar dos pais.
- Finalmente, Miguel!
– Gritou Pedro. O Irmão da Menina acenou, pedindo desculpas sem dizer uma
palavra. Sem tempo a perder, Helena saiu para chamar o Fotógrafo – amigo da
família – que o Pai da Menina contratara para registrar aquele dia tão
especial. Foram quase 30 minutos para tirar todas as fotos que o Aniversariante
queria. Na verdade, como Joaquim, Luciana e Felipe – pai dela – ainda não
tinham aparecido, a sessão de fotos precisaria de um intervalo, para alívio de
todos.
Helena, Luís, Laura e Pedro voltaram
a formar uma roda de conversa, enquanto Haroldo passou o posto de babá para
Miguel e foi dar atenção a dupla formada por Bendita e Mia. Francisco e Lívia
tentavam entrar em contato com Joaquim e Luciana.
- Será que eles
não vêm? – A perguntou veio cedo demais.
- Onde é o
salão? – Felipe gritava a plenos pulmões. O olhar de todos os convidados se
voltou para a porta de entrada do salão de festas.
- Pai, hoje é
aniversário de Tio Luís. Por favor, não...
- Não, nada!
- Felipe, o
Senhor não sabe o quanto Tio Luís esperou por esse dia... – Joaquim tentou
acalmar o sogro.
- Ele aguenta!
Se eu ainda estou em pé depois de saber que minha filha está grávida aos 18
anos, tenho certeza... – Depois da palavra GRÁVIDA, ninguém mais escutou o que
Pai de Luciana dissera. Quando os três finalmente entraram no salão, Laura
perguntou:
- O que você
quer dizer com grávida? – Felipe olhou para Joaquim pedindo que ele explicasse
o óbvio. Sem graça, o Irmão Mais Velho do Menino disse em voz alta:
- Eu vou ser
pai. – Apesar de não ser o momento adequado, Francisco deixou escapar uma
risada. Depois de perceber que o irmão falava de maneira séria, o Menino tentou
consertar o erro, pedindo desculpa.
- Filho, eu não
sei se escutei direito. Você pode repetir?
- Luciana está
grávida de Joaquim. – Gritou Felipe, fazendo Júlia chorar. Miguel, que segurava
a Irmã Mais Nova nos braços, tentou acalma-la, chamando a atenção do Pai de
Luciana. – Ter um pai adolescente na família não era suficiente? – Comentou
Felipe, apontando para os irmãos de Lívia.
- Esse se
esqueceu de ler o roteiro antes de vir fazer cena. – Comentou Haroldo, fazendo
Bendita rir baixinho.
- Júlia é minha
filha. – Corrigiu Luís, em tom de sibilo, mais para si do que para os demais. Como
a caçula da família não parava de chorar, Bendita pegou a neta no colo e desceu
as escadas, deixando a confusão para três. Não foi fácil acalmar a Pequena, que
só se deu por vencida por conta do cansaço.
- Você pode
trazer um copo de água com açúcar? – Helena pediu para o garçom mais próximo,
na tentativa de acalmar o Pai de Luciana. Depois de dizer uma série de
impropérios, Felipe se desfez em lágrimas.
- O que eu fiz
de errado? Será que não fui um bom pai? Me perdoa, Ana! Eu fiz o meu melhor. –
Desculpou-se Felipe em voz alta. Antes que alguém pudesse dizer alguma palavra
capaz de consola-lo, uma voz conhecida interrompeu o lamento do Pai de Luciana.
- Achei que
teria a honra de estragar a festa, mas, pelo visto, cheguei tarde demais. –
Falou Clara, aparecendo de surpresa. Ela não parecia sóbria. – Mas... Como
diria o poeta “nada é tão ruim que não possa piorar”, não é mesmo, Miguel? –
Alguns segundos se passaram antes de Clara voltar a falar. Pela expressão que
o Irmão Mais Velho da Menina tinha no rosto era óbvio para ela que a história
de hoje ainda não era de conhecimento geral – Quer fazer as honras? Ou seria
melhor pedir para seus cúmplices me ajudarem a contar? – Perguntou Clara, olhando
de Lívia para Francisco. Mia, então, percebeu o que estava prestes a acontecer.
- Clara, por
favor... – Pediu Miguel, com seu tom de voz baixo característico.
- Por favor?
Você me trai com essa pirralha e quer que eu tenha calma. – Clara apontou para
Mia sem se importar com as consequências.
- O outro traiu
a namorada?! Olha o que você foi arranjar, Luciana! Imagina se corre no sangue... – Lamentou
Felipe, chorando copiosamente.
- Esse filho não
é meu! – disse Pedro, em voz alta, para “limpar” o nome da família.
- Estrelinha,
que enredo confuso. O que está acontecendo? Estou perdido no meio de tantas
revelações. – Comentou Haroldo ao se aproximar de Lívia. A Menina riu.
Francisco, que estava perto suficiente para escutar, também achou graça.
- Você tem
certeza que viu Miguel e Mia... Juntos? – Perguntou Luís, sem saber como pôr a
pergunta em palavras. O Filho Mais Velho não gostava de se envolver em
confusões. Ele era sério e calmo demais, na maioria do tempo. Por isso, quando
acontecia algum problema no colégio quase sempre se tratava de Lívia. Daria
para contar nos dedos o número de vezes que os pais da Menina foram chamados no
colégio por conta de Miguel.
- Pergunte a
Lívia. Ela e Francisco também estavam na hora do...
- É verdade! –
Confirmou o Irmão Mais Velho da Menina, atraindo a atenção dos presentes.
- Como fui
burra! Depois que você começou a dar aulas de física e matemática para essa
pirralha...
- Chega, Clara!
Eu já expliquei o que aconteceu...
- Quem me
garante que foi a primeira vez? Quem me garante que não aconteceu mais alguma
coisa entre vocês dois?
- O que você quer
dizer com ‘mais alguma coisa’? Eu preciso sentar. – Disse Pedro, meio pálido. –
Felipe riu alto, não por achar graça, mas por se sentir desesperado.
- Se ser avô é
ser pai duas vezes será que serei duas vezes mais incompetente?
- Pai... – O
sentimento de fracasso nos olhos de Felipe era tão evidente que nada que
Luciana dissesse parecia ser capaz de consola-lo. Na verdade, nada que a Melhor
Amiga da Menina dissesse para si mesma seria capaz de consolá-la.
- Miguel? – Luís
chamou a atenção do filho, pedindo – sem realmente formar a frase – uma
explicação.
- É verdade que
a gente se beijou, mas foi a primeira vez que isso aconteceu...
- E não vai ser
a última... – Disse o Pai de Luís, organizando mentalmente as
revelações daquela noite. Haroldo sempre escolhia as palavras erradas na hora errada. E,
dessa vez, o Avô da Menina falou alto demais, chamando os olhares dos
convidados para si. – Falei alto demais, Estrelinha?
- O Senhor
também é cúmplice desses dois?
- Minha querida,
o namoro de vocês já acabou há muito tempo. Só não vê quem não quer. Vocês só
não oficializaram o término, porque se acomodaram no papel que um tinha na vida
do outro. – As palavras do Avô da Menina eram tão certeiras que a família e os
convidados ficaram sem palavras. – Não foi o melhor fim de uma história, mas,
pelo menos, ele, finalmente, chegou. É melhor terminar uma história e partir
para uma aventura nova do que insistir em um livro ruim. – A raiva que Clara sentia foi, aos poucos, se dissipando. Ela sabia que Haroldo tinha razão, só
não queria admitir tão cedo que nem ela nem Miguel foram corajosos o suficiente
para colocar o ponto final na história dos dois. – Felipe, você não fracassou
como pai, nem será um avô incompetente. – Haroldo agora falava com o Pai de
Luciana. – Na verdade, não acredito que a palavra fracasso se aplique quando o
assunto é família. Fazer o seu melhor não é garantia de que tudo sairá como
planejado, como ensinado. Luciana ser mãe não estava nos planos, mas, às vezes, as coisas que menos desejamos
no presente se tornam as mais valiosas. Bendita não queria casar comigo quando
nos conhecemos. Hoje em dia, ela diz que nada preenche mais o seu coração do
que nossa família. Você precisou criar Luciana sozinha depois que Ana se
foi. Mas, apesar de toda a dificuldade, tenho certeza de que, no final, a filha
de vocês é o presente mais valioso que a vida te deu... – Felipe começava a se
acalmar e Luciana e Joaquim se sentiram acolhidos pelo Avô da Menina. – Vai ser
difícil? Com certeza! A rotina vai mudar? Completamente! Joaquim e Luciana
terão que assumir uma responsabilidade para qual eles não estavam preparados,
mas quem está realmente preparado para o futuro? Para viver a vida?
Depois das palavras do Sábio
Avô, o anfitrião e os convidados jantaram em silêncio e decidiram que
comemorariam o aniversário de Luís em outra ocasião. Estavam todos muito
cansados para continuar celebrando os cinquentas anos do Pai da Menina. A
família de Francisco e a de Luciana foram pra casa. Os pais, os avós e a irmã
caçula de Lívia dormiam, enquanto a Menina e o Irmão Mais Velho observavam as
estrelas. O telhado do restaurante era um dos lugares preferidos dos dois, o
esconderijo não tão secreto que os dois compartilhavam. Ali, eles não
precisavam falar mais do que o necessário – o que já fazia parte da rotina de
Miguel. Ficar em silêncio na companhia um do outro já era suficiente. Se
trocassem mais de 20 palavras em uma hora já era muito. Hoje, não seria
diferente. Os dois estavam deitados nas cadeiras de praia que o Pai colocara
ali muitos anos antes – depois de desistir de proibi-los de visitar o telhado.
Lívia olhou para Miguel e riu. Ele não precisava de palavras para entender o
que aquela risada dizia. Ao invés disso, Miguel deixou as estrelas de lado por
alguns instantes e olhou para Lívia. Ele sorria de maneira envergonhada e respondia o “eu
sabia” silencioso que a risada da Menina escondia.
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