Dedicado aos meu avós! Existe um pouco de cada um deles nas palavras abaixo.
Lívia procurava
suas antigas sapatilhas de balé, no baú do quarto bagunçado, quando encontrou o
que parecia ser uma antiga carta escrita pelo Avô. No envelope estava escrito
“para minha pequena estrelinha”. A Menina passou os dedos pelo papel desbotado
e soprou a poeira para longe. Com cuidado, ela abriu o envelope e desdobrou a
carta. A caligrafia cuidadosa do avô fez Lívia sorrir e dizer em voz baixa:
- Vovô. – Ela
achava engraçado como o Avô caprichava. Ele queria que cada letra fosse o mais
legível possível. Segundo o Avô “quem entenderia seus tesouros quando os
encontrassem, se sua letra fosse apenas um garrancho?!”. Inocente, a Menina
perguntava: “o senhor vai deixar tesouros em forma de palavras, Vovô?”.
Sorrindo, ele respondia: “há tesouro mais valioso, Pequena Estrelinha?”. Ela
não sabia, mas acreditava no avô. Acreditava que, como uma das formas de expressão,
as Palavras tinham muito a dizer.
- Que segredos
você me deixou, Vovô? – Perguntou Lívia para a carta, imaginando que o avô
estava ali contando em seu ouvido.
A Menina fechou
o baú e apoiou-se nele, procurando uma posição mais confortável para as costas.
Na carta tinha escrito:
“Minha Pequena
Estrelinha,
Você ainda é
muito nova para encontrar este tesouro. Mas acredito que em um dia nublado ou
quem sabe ensolarado, de alguma forma, esta carta chegará as suas mãos. Não sei
o que seus pais desmiolados têm ensinado a você todos esses anos e falo
“desmiolados” da maneira mais carinhosa possível, mas acredito que posso
ensinar alguns segredinhos da vida para você, minha neta. Avós não foram sempre
velhos como seu pai a fez imaginar. Também já fui jovem. Sua avó, então?! É
jovem até hoje. Falando nela, alguém precisa avisá-la de que aquela blusa cor
de girassol é um crime aos olhos alheios... Se você encontrar esta carta antes
dos 20 anos, faça-me esse pequeno favor...
...Onde
estávamos mesmo? Espere um segundo, estou tentando lembrar. Melhor reler. Mais
outro segundo. Pronto. Já sei onde estávamos... Não sei o que seus pais
desmiolados ensinaram a você, o que eu sei é que, às vezes, a vida não é tão
alegre quanto às marchinhas de carnaval. Ela é, na verdade, em alguns momentos,
um imenso vazio. Não o vazio que espera ser preenchido, mas o vazio que ocupa
todo o espaço, que preenche o todo com a falta. Talvez soe estranho aos
ouvidos. Talvez não faça o menor sentido agora. Mas num futuro, próximo ou muito
distante, esse vazio cheio deixará de ser um paradoxo incompreensível. E se
assim não for, posso dizer o seguinte, minha Pequena Estrelinha, esse Vazio
Cheio é o fim/o recomeço, é o que precede o reencontro de si mesmo nesse mundo
louco”.
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